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28/07/2021 00:00

Valor Econômico| Valor Econômico

Inoue, o mais brasileiro dos japoneses da Toyota

Por Marli Olmos — De São Paulo

O presidente da Toyota para a América Latina, Masahiro Inoue, morava no Japão em 2016, e foi para o Rio em agosto daquele ano, durante os jogos olímpicos. Desta vez, ele mora no Brasil, mas está no Japão desde o dia 20, a passeio. Em nenhuma das duas vezes, no entanto, ele conseguiu assistir as competições presencialmente. Desta vez o evento é fechado ao público. Já em 2016, ele passou o tempo todo acompanhando seu chefe, Akio Toyoda, presidente mundial da Toyota, que decidiu percorrer o Rio para analisar como a montadora poderia ajudar no transporte na Olimpíada em Tóquio.

O trânsito confuso e barulhento do Rio inspirou Toyoda a oferecer, para transporte dos atletas na vila olímpica de Tóquio, um veículo 100% elétrico e que funciona de forma autônoma, sem necessidade de motorista. Até aqui, o modelo chamado e-Palette, uma espécie de van, só havia sido mostrado ao público como veículo experimental. Não está, ainda, disponível no mercado.

Toyoda não poderia ter escolhido pessoa de confiança melhor do que Inoue para acompanhá-lo no Rio. Nenhum outro japonês da Toyota conhece o Brasil tão bem quanto ele. Durante seus 34 anos de empresa, ele já soma oito vivendo no Brasil, em três diferentes períodos. Sem contar a viagem de aventura que fez, ainda estudante, quando depois de passar por Montevidéu, Buenos Aires e Rio, foi parar numa pensão no bairro da Liberdade, em São Paulo. “Nunca imaginei que havia tantos japoneses fora do Japão”, lembra o executivo.

No comando da companhia na América Latina desde 2019, Inoue viajou este mês para Quioto, sua cidade natal, para ver a mãe, que ele não visitava desde que a pandemia impôs o isolamento. Já a esposa, Naomi, também japonesa, ficou próxima dos atletas. Artesã especializada em arte brasileira, ela viajou para o Japão semanas antes do marido para trabalhar como voluntária, na confecção de crachás para as comitivas da Olimpíada.

As viagens entre Brasil e Japão fazem parte das vidas de Inoue e de Naomi desde que eles tinham apenas um ano de casados. Em 1992, recém-contratado pela Toyota, o então jovem engenheiro inscreveu-se num programa de estágio da montadora no exterior. Como as vagas nos Estados Unidos eram mais disputadas, optou pelo Brasil, que ele já conhecera no passeio como estudante mochileiro.

Naquela época, apenas três japoneses trabalhavam na fábrica da Toyota em São Bernardo do Campo. Mas nenhum deles - incluindo o presidente e o diretor financeiro - tinham tempo para ensinar o recém-chegado sobre as coisas do Brasil. O jeito foi “aprender na marra”.

O desafio incluiu uma temporada em Florianópolis, organizada com a ajuda do Banco de Tokyo. Na capital catarinense, o casal teria chances de mergulhar na cultura do país e iniciar o aprendizado do português. Com formação em engenharia pela Universidade de Quioto, Inoue ingressou na Universidade de Santa Catarina como aluno ouvinte.

Foi em “Floripa”, como ele logo aprendeu a chamar a cidade, que Inoue começou a notar o esforço que o brasileiro, em geral, faz para ajudar estrangeiros. Ele e a esposa se divertiam quando as crianças os seguiam para ver de perto o casal de olhos puxados. Entre os descendentes de imigrantes europeus, não se viam os nipônicos que tanto haviam marcado, anos antes, sua estadia no bairro da Liberdade.

De volta a São Paulo, começou a chamar a sua atenção a frequência com que os brasileiros mudam de emprego. “No Brasil, a empresa privada, grande ou pequena, investe e quer resultado logo”, afirma. Já no Japão, diz, é raro ver esse “entra e sai”. “Existe mais paciência. Trabalhar na mesma empresa é, muitas vezes, um plano para a vida toda”, diz.

A primeira temporada de Inoue no Brasil era para ter durado um ano. Mas, por sorte, como ele diz, o período coincidiu com a abertura das importações de carros. O funcionário japonês foi, então, convocado para ajudar a Toyota a ampliar vendas no mercado brasileiro. Até então, a presença da marca limitava-se ao jipe Bandeirante, produzido em São Bernardo. Lhe disseram que o plano de expansão, com carros importados, duraria mais ou menos dois anos. Foram quatro.

O tempo extra serviu para Inoue vivenciar um período importante da economia brasileira. Foi marcante, para alguém que vinha do Japão, a experiência de estar num país que dominou a hiperinflação e atingiu uma duradoura estabilidade econômica. Em princípio, ele não pôs muita fé de que o Plano Real, lançado em julho de 1994, daria certo. “Fiquei em dúvida porque em casos assim é difícil o país não voltar à inflação”.

O retorno para o Japão, em 1996, provocou uma certa estranheza. “Sem internet, naquela época, eu havia perdido informações sobre muitas coisas, inclusive terremotos que atingiram o país”, afirma. Fora do Brasil, ele assumiu diversos cargos de liderança nas áreas de planejamento estratégico e vendas. O executivo voltou a viver no Brasil entre 2011 e 2013, o auge da produção e vendas de veículos no país. Depois disso, ele também morou no Canadá.

Mas os laços com o Brasil e com a região “tão culturalmente diversificada”, como ele diz, se mantiveram. Parecia até que Inoue havia “voltado para casa” quando em 2019 ele foi apresentado como o novo presidente da Toyota na América Latina e Caribe.

Nessa nova passagem pelo país, o executivo, com 57 anos hoje, fui incumbido por Toyoda de inserir a América Latina, onde a companhia tem seis fábricas, no plano global de descabonização. Inoue está particularmente empenhado em entender o desenvolvimento da produção do etanol nas usinas brasileiras. O derivado da cana de açúcar é forte candidato a ter um papel mais relevante como alternativa de energia limpa para veículos.

Nesses anos de traslados entre Japão e Brasil, “Massa”, apelido que ganhou aqui, aprendeu a mesclar características das duas culturas. Sempre sorridente, transmite o bom humor que caracteriza muitos dos brasileiros; mas, ao mesmo tempo, preserva a cautela com que os asiáticos sempre conduziram os negócios em todo o mundo.

Toyoda também é cauteloso. Na véspera da abertura da Olimpíada deste ano, o presidente mundial e neto do fundador da montadora, desistiu de veicular comercial de TV da Toyota no Japão durante os jogos. Mas o patrocínio e transporte de atletas foram mantidos.

Inoue perdeu a chance de assistir os jogos presencialmente em duas Olimpíadas. Mas, na posição de volante nas partidas de futebol internas da empresa, ele consegue manter seu vínculo com o esporte.



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